Vamos cuscar? 3#

Não sei bem precisar como é que começou esta amizade. Talvez as verdadeiras, nem se explicam. Sentem-se no decorrer dos dias. Sei que descobri que trabalhar em equipa assim, não se chama trabalho. É uma forma de estar que transcende os valores simples de  fazer tarefas e se confunde com os valores mais humanos: o prazer de criar, estar, (rir muito, e às vezes até chorar), num respeito pelo outro e enfrentar os obstáculos com o espírito crítico de se transformarem em desafios, descomplicando o caminho a fazer. E sim, as muitas partilhas e aprendizagens que se fazem.

Na Joana, existe uma riqueza criativa muito grande, que se torna visível nos pormenores da sua pintura e escrita. Nos pequenos detalhes, que compõem o quadro completo. Julgo que muitas vezes essa criatividade a transcende e que os dias de maior "sofrimento" artístico têm a ver com uma qualquer divindade das artes que se apodera naquele momento e a desafia:

"Como é que é? Larga lá o que andas a fazer põe uma tela, uma folha, um pincel, um novelo, uma picareta na mão e faz alguma coisa!"

Uma sensibilidade humana, que não se fica pelas artes e que é palpável no seu dia-a-dia: o respeito pela natureza e pelo ser humano.


Mais de 50 telas feitas. Um segundo livro já publicado e que vai contar, não com um lançamento oficial, o primeiro ocorrido no passado dia 23, mas com dois. O próximo será a 30 ainda este mês, na Biblioteca Municipal da Sertã. Um título e uma história mais do que ternurenta, a adoçar um fim-de-semana do dia da Mãe:





Vamos Cuscar?

Idade: 31

Comidas preferidas: As que o meu marido inventa

Um livro a não perder: Sinto que vou ser injusta com todos os outros livros que são mesmo imperdíveis, mas talvez o livro Siddharta, de  Hermann Hesse. Gosto muito da forma como este livro nos põe a pensar sobre tudo o que podemos ser e onde podemos chegar nesta travessia que é a vida.

1.       Se pudesses convidar alguém famoso (vivo ou morto) para jantar, quem escolherias e porqué?
Só pode ser um? Gostava mais de fazer um banquete com vários convidados, escritores, músicos, personagens de livros! Assim sendo, já que só posso mesmo escolher um,  talvez optasse pelo Fernando Pessoa, assim sempre trazia os amigos (ehehhe). Por ser português, genial e gostar de absinto, tenho a certeza  que seria um jantar interessante.

2.       Faz uma viagem ao passado. O que dirias à Joana Lopes de 16 anos?
Ia dizer: Pára de ouvir Nirvana na função repeat…isso é doentio, miúda!

3.       Em termos da escrita, tudo começou quando ganhaste o prémio de livro infantil do Pingo Doce... ou começou muito antes?
Começou muito antes, o prémio foi a forma das coisas guardadas na gaveta verem a luz do dia.
A escrita teve um papel muito importante durante a minha adolescência, era uma forma de exorcizar todas as coisas que sentia. Nessa fase descobri gostava muito de escrever, acabei por nunca perder esse hábito.

4.       Desligado o telefonema  com a notícia vencedora ... o que se faz, sente, pensa?
O que se faz: continua-se a almoçar, naquele que passou a ser “o almoço mais eufórico da minha vida”.
O que se sente: primeiro, uma explosão de felicidade! Depois comecei a pensar que talvez a chamada não tivesse acontecido e que eu estivesse a sofrer de um surto psicótico ou algo do género :D . Aé ter a confirmação oficial que era a vencedora, dava por mim a questionar se tudo o que estava acontecer era mesmo verdade.
O que se pensa: Quando fui contactada, uma das informações que me deram foi que teria de manter a informação em segredo absoluto. Claro que o meu pensamento no final da chamada foi: A sério que não posso contar a ninguém? Que se lixe, vou já ligar ao meu pai!

5.       Qual o fascínio pelo universo da escrita infantil?
Muitas das histórias que escrevo são inspiradas em memórias de infância, este exercício de recuar no tempo e relembrar vivências e ideias que tinha na altura é sempre bastante divertido. Talvez não lhe chame fascínio, a palavra que mais se adequa creio que é mesmo, diversão. Diverte-me recordar as coisas e escrever a partir disso.
Escrever este tipo de histórias é quase como fazer uma composição de recorte e colagem de várias peças, podem ser memórias, coisas que observo no dia-a-dia, ideias que tenho, todas juntas, dão forma às personagens e corpo ao texto.

6.       As tuas telas também contam histórias. Como é o teu processo criativo na área da pintura?
Depende, não funciono sempre da mesma forma e por isso o meu processo criativo também varia. Posso pintar, porque vi uma imagem que me despertou interesse. Posso pintar, porque li um livro sobre um tema e isso dá-me vontade de explorar ideias em termos plásticos. E muitas vezes, posso pintar só pelo prazer que me dá explorar materiais novos ou técnicas diferentes.
Estes são os pontos de partida, depois, enquanto estou a desenvolver a tela, o processo criativo continua a desenvolver-se a cada pincelada, nas escolhas das cores e das formas. Uma parte que me diverte muito, que tem que ver com o processo criativo e que liga as minhas duas paixões, a escrita e a pintura, é a escolha do título das obras. Acho sempre que este elemento é muito importante, pois pode servir como apoio à interpretação da obra, ou simplesmente, pode existir para promover uma leitura diferente da mesma. Por exemplo, estou a lembrar-me da obra “Bi-God”, que retracta um rapaz de bigode, quando dizemos o título em voz alta soa a “bigode”, esse elemento afirmador da masculinidade, mas quando olhamos para a constituição do título, temos duas palavras Bi e God. A palavra Bi, remete-nos para a questão da bissexualidade e God, para Deus. Assim, um retracto tão simples quanto a aquele, através do título, pode gerar alguma controvérsia. Afinal o que é que o público vai achar que eu quis representar? Jogar com a masculinidade/feminilidade do rapaz que usa bigode? Um Deus bissexual? Brincar com as palavras? Enfim, o título pode ser uma porta para leituras diferentes e isso agrada-me.



7.       Qual foi o quadro que mais gozo te deu fazer? 
Maior gozo…não sei, se me perguntasses qual foi o mais difícil, era mais fácil :D
Acho que gozo acabo por sentir em todas as pinturas, porém, aquela sensação de satisfação só sinto quando a obra está pronta. Durante o período em que estou envolvida numa obra, sinto uma sensação de me desafiar a mim própria, uma vontade de querer que a tela que estou a pintar no momento seja melhor que a anterior.
Este foi o quadro mais difícil, foi muito desgastante e foi a única vez que entrei num tal estado de frustração que comecei a chorar enquanto pintava.
Estava tudo a correr bem, estava a gostar do resultado, mas passado umas pinceladas, começou a ficar tudo horrível. Fiquei tão frustrada que comecei a pintar o quadro todo de preto, quando dei por mim, completamente desgastada, olhei para a tela e pensei: Sim, é isto! É assim mesmo que quero que fique!
E ficou, ficou mesmo assim, não lhe toquei mais, ainda hoje é um dos quadros que mais gosto.






8.       De que quadro vendido, mais te custou despedir? 
Muito sinceramente, nenhum! Adoro saber que as minhas obras estão espalhadas por muitos lugares, aqui e no estrangeiro. Além disso, para mim, vender um quadro significa sempre que alguém valoriza o meu trabalho e gosta do que faço, portanto, é sempre uma sensação boa dizer “adeus” às minhas “crias artísticas”.

9.       E agora este livro novo...  como surge esta história?
A história surge daquele tal processo de recorte e colagem de ideias, memórias e observações.
Esta história é contada aos olhos de uma criança que acompanha a gravidez da mãe. Ao longo do texto somos conduzidos pelas perguntas que a crianças vai fazendo a si própria e pelas respostas inusitadas que encontra para essas perguntas.
Quando escrevi esta história inspirei-me muito no meu sobrinho, de tal forma que alguns dos nomes que aparecem no livro, correspondem a pessoas que existem na sua vida, a educadora Lina, a avó Céu, são exemplos disso. Também me inspirei na forma ternurenta e divertida como ele se expressa em relação ao mundo que o rodeia.

Vamos fazer uma viagem ao futuro. Em termos da escrita e da pintura, o que te deixará muito feliz, num futuro distante?
Vou ficar muito feliz se puder fazer todos os dias estas duas coisas que me fazem sentir inteira, que ao fazê-las possa ter atingindo outros sonhos e ajudado, de alguma forma, o mundo a ficar melhor.
Para mim, a felicidade é uma questão muito pessoal, cada um é feliz à sua maneira. Ficarei muito feliz quando chegar o dia em que simplesmente ao acordar posso escolher se vou escrever ou pintar e saber que, com estas duas paixões, posso ajudar alguém.
10.   Este blog chama-se Penso Rápido – pequenos remédios para as comichões do dia-a-dia. Que Penso Rápido usas no teu dia-a-dia?
A sabedoria da minha avó Céu. Com os seus 92 anos tem uma visão muito própria sobre a vida e, para minha sorte, tem-me passado essa forma de ver as coisas, simplificando, descomplicando, desvalorizando essas tais comichões.


Mais informações sobre a Joana Lopes aqui e aqui. 

Sem comentários:

Enviar um comentário