Marmita e outras histórias

Levanta-se quase todos os dias pelas 6h. Ainda mal amanheceu e já tratou de mais uns quantos afazeres, deixa tudo orientado para o seu pequenote e antes dos homens lá de casa se levantarem, já ela está a sair para o trabalho.

Um trabalho digno, a que se dedica com muito profissionalismo. Um trabalho que não lhe paga há uma série de meses. Sim, porque ela vive do ar, fazendo concorrência à fotossíntese diária das plantas lá de casa. É ver quem respira mais...ar! Uma série de embrulhadas de lei não lhe permitem bater simplesmente com porta na cara daqueles senhores. Se é que se pode chamar senhores. 

E de forma a reduzir custos, leva os seus lanchinhos, a sua marmita de almoço. Que dá trabalho a preparar, precisa de organização e gestão doméstica. Mais uma vez. O resto da "maltinha" de lá, não se percebendo bem como, continua a poder comer fora todo o santo dia. Às vezes fazemos companhia uma à outra, por telefone, entre uma colher de sopa e uma garfada de salada. Rindo e fazendo rir para alegrar o ambiente cinzentão.

Até aqui nada de novo. O que gostei e que caracteriza a querida D. é a capacidade de resistência, de ver de outra forma algo que nem dá assim muita vontade de rir. Foi por isso mesmo, que no outro dia, e após uma visita da medicina do trabalho foi a única que teve os resultados do colestral baixos.

" - Ah...é por isso é que trazes todos os dias a marmita de casa?
- Claro, já viram o BEM que me faz à saúde?
- Pois, realmente...e nós a comer os pastelinhos, rissóis e outros que tais."

A verdade não será bem esta, embora a consequência seja positiva. A minha amiga D. é uma lutadora. Sempre foi. Conheço poucas pessoas que depois de levarem com toda onda na cara, se consigam levantar, mesmo a rastejar, para aproveitar o sol da praia. E ela já levou muitas e sérias. Ao ponto de quase nem conseguir respirar entre elas. Sempre a conheci assim. Por isso foi tão boa a sua resposta. Criou a sua própria história.

Às vezes, é preciso criar a história no momento para proteger de quem faça mal. Pelo próprio que merece ser visto e olhado com dignidade. Porque os outros, na maior parte das vezes, não têm nada a ver com a vida alheia. A não ser que gostem muito como Amigo a sério. Como eu gosto da D.


Embalagem por inteira

Há embalagens e pacotes dos mais variados feitios e tamanhos. Vende-se o produto que lá vai dentro e que se espera que seja bom, mas é também muito importante o que se vende por fora. A embalagem. O pacote.

E chateia muitas vezes quando se diz que o interior é que importa, não faz mal ter quilos a mais, o cabelo desgrenhado e a roupa num desatino. Não faz mal se o próprio não se importar. O que é certo é que é bom olhar ao espelho e ver o que lá está. Independentemente dos gostos, apenas olhar e gostar. E aceitar é claro, que o tempo de se achar que precisava de mais uns centímetros de altura e menos uns de largura já lá vai. Cada um é como é. Mas é nesta aceitação do pacote completo, da embalagem de dentro e de fora que é ainda importante batalhar.

Não se pretende aqui alimentar futilidades inúteis. Apenas realçar que as pessoas são várias partes, que se interligam e fazem sentido num TODO. Nem só o que não se vê, nem o que apenas está à vista. Por isso é tão importante ouvir devidamente quando:
  • uma jovem diz que está muito gorda ou magra;
  • uma mulher depois de ter filhos voltar a sentir-se bonita (independemente de ter mais ou menos quilos, de a anca ter ido para sítios que se desconhecia e o peito andar a baloiçar);
  • um homem diz que tem um nariz demasiado grande, ou o cabelo está a cair.
A vaidade q.b. só pode fazer bem. Olhar-se ao espelho e ver o que lá está, aceitar e se possível ir em busca do seu conceito de beleza, que serão tantos, quantas as caras que o reflexo do espelho dê.

Ser bonito por inteiro começa por dentro mas às vezes é preciso começar ao contrário. Naqueles dias cinzentos, uma roupa mais domingueira, maquiagem, sapato alto, camisa engomada...o que funcionar, podem dar um empurrão. E se não resolvem as contas e as aflições do dia-a-dia, pelo menos ajudam a que o pacote ou a embalagem se sinta mais confortável e "venda" melhor o produto. O estarmos no caminho ascendente para o bem-estar.

Como esta embalagem de leite. Catita, não?




Simplex de cada dia

Os dias estão cheios. Cheios de sons e cores. E rápidos com tudo à mistura. Por vezes também complicados com muitas urgências e imprevistos que surgem no caminho. Ele são as contas que não param de chegar e erros de acertos que é preciso explicar pela galática vez; os prazos de trabalhos e projectos a cumprir; compras para abastecer a cozinha; responsabilidades familiares... Sabe bem viver a este ritmo para alguns, por algum tempo. Para outros nem por isso e anda-se mais carrancudo, todo o santo dia. Toda a santa semana.

O simplex de cada dia é uma medida ultra sofesticada, estudada e testada por gente que percebe disto. Extra-terrastres ou para os amigos E.T. E daí as dúvidas de todos quando começaram a dizer que todo o santo dia, toda a santa semana, há coisas simples no dia-a-dia que nos podem fazer sorrir ou dar algum conforto. Imagine-se que tais criaturas disseram que:
  • Tomar um pequeno-almoço, de vez em quando, sentado e com tempo para mastigar só demora mais 5 minutos. De vez em quando...
  • Comprar uma carteira de flores para semear num vaso custa pouco mais do que 1 euro e demora outros 5 minutos a semear;
  • Remendar umas calças gastas de tanto descobrir mundo, com uma joelheira à maneira, ficou também muito aquém do que comprar umas novas;
  • Dar a mão de alguém de quem se gosta e até já se tinha esquecido de o fazer porque há sempre um mundo de afazeres todos os dias. Apenas alguns segundos.
  • E parar tudo neste instante e olhar pela janela mais próxima. Dez segundos. Não mais do que isso e ver as tonalidades de azul lá do alto ou descobrir uma outra cor qualquer entre telhados e torres altas.
Simplex: papas de aveia, maçã, canela e mel; Estatice Variada a mergulhar no vaso daqui a pouco; remendo Sport e a janela aqui à direita.

Grandes malucos estes E.T.! Grandes malucos...






O sinal e a cicatriz

Olhando para a cara via-se um sinal pequeno mas bem definido junto ao canto do lábio direito. Algures escondido, por baixo das camisolas justas estava uma cicatriz bem delineada com os seus 13 pontos. Pormenores. De tamanho variável que podem provocar (ou não!) mais ao menos aflição, ao seu dono, mas sem sombra de dúvidas, pormenores.

" - Ah...não me digam! Então esqueci-me de trazer almoço! Oh pá, não acredito!
- Não faz mal. Tenho aqui sopinha, uma sandocha bem aviada. Vá, não tem veneno! Come daqui, que mais logo já partilhamos uma fruta fresca ali na mercearia debaixo.
- Obrigada!" Pormenores.

Via sms: Só para dizer que estou aqui, aí contigo. Um beijinho grande, abraço apertadinho cá do fundinho. P.S.: Vai correr tudo bem. Estou contigo.Pormenores.

Trrrriiiinnngggg (ou outro toque polifónico qualquer).
"- Sim?
- Olá é a M. e estive a pensar. Olha lá, tu com esse aperto todo, com os atrasos de pagamentos do ordenado, dá-me aí o teu NIB que mesmo que pouco, ainda te consigo transferir algum dinheiro..
- És parva ou qué? Tu também tens crianças! Não, nem pensar. Mas ... só de ofereceres, para mim já vale muito. Obrigada..."
Pormenores.

Os tempos são difíceis. Todos o sentem de uma ou outra forma. Não são tempos de apertar o cinto, mas de autênticos espartilhos de retirar a respiração! E os pulmões!

E depois há os pormenores. Dos outros. Dos próximos e dos que não são tanto mas que surpreendem com pequenos GRANDES gestos. Não é preciso muito, nem ter dinheiro. Os pormenores aparecem do nada em forma de sms, telefonema, mail ou batendo à porta com uma fatia de bolo. Em cima da mesa de trabalho sob a forma de chocolate ou gomas. Com uma música que se dedica. Ou um abraço beeeem apertadinho e sincero. Pormenores. Pormenores que fazem a diferença.

Como este copo de água, ao que se juntou uns restos de raminhos de um centro de flores já a secar. E já estão a nascer pequenos "pormenores" nestes ramos. Inesperados mas mais bonitos por isso mesmo.

P.S.: Desafio a que dediquem um pormenor hoje a alguém que o mereça ou precise. A quem quiser, partilhe por aqui.



Estantes I.Q.É.A.

As vezes a desarrumação externa é proporcional à interna: encontram-se migalhas de pão num rasto de deixar qualquer colónia de formigas histérica; roupa espalhada; brinquedos a invadirem todas as divisões da casa; livros e revistas abertas, semi-rasgadas ou dobradas pelo chão; várias cartas do correio "eu já arrumo"; a mesa de trabalho ganhou vida própria com a agenda aberta para a semana que vem, entre canetas e folhas empilhadas... E a moldura deste cenário varia consoante a casa e os ocupantes da mesma. À 2ª ganha tudo contornos especiais porque é o arrancar de uma semana de trabalho ou semi-trabalho para os novos semi-desempregados-que-até-têm-algum-trabalho-mas-não-chega...ou a malta dos recibos verdes, agora mais finos porque são electrónicos. "Ah eu agora subi de escalão, sou electrónico, já não dependo do papel, e tal."

Por dentro é também assim um empilhar de assuntos desorganizados sejam pessoais, familiares ou profissionais em que, pelo desgaste de dias mais difíceis ficou o desatino total. É aqui que entra a muito eficaz estante I.Q.É.A, modelo nacional com uma pitadinha de influência nórdica. Estante I.Q.É.A. ou  estante Isto Quer É Ambiente. Venha de lá o Feng Shui ou as teorias do Design dizerem o que quiserem mas a quantos já aconteceu que mal se acaba de arrumar a secretária, uma gaveta, e para os mais ambiciosos e malucos, uma divisão inteira, e respira-se logo uma outra tranquilidade e Ambiente, por uns momentos? Quantos? Quantos?

As desarrumações internas são um pouquinho menos simples de se organizarem mas é um facto que tendo que se começar por algum lado, pode-se começar precisamente pelo exterior:
  • Marcar uma consulta há muito adiada;
  • Arrumar a mesa de trabalho, despensa, o armário da roupa;
  • Devolver objectos emprestados;
  • Pegar no telefone e ter a tal conversa;
  • Pagar uma conta atrasada e despachá-la de vez;
  • ...
Cada um terá as suas listas de assuntos desarrumados. O certo é que uma vez tratados, algo muda por dentro. Avança-se. Organiza-se. E se há quem diga que a necessidade de muita arrumação externa é sinal de pouca flexibilidade interna, quando em dose certa, arrumar ou organizar o ambiente que nos rodeia, melhora o ambiente connosco próprios. E afinal, se vivemos 24h, sob 24h com o mesmo inclino que somos nós, há que fazer um certo investimento e dar-lhe um empurrão para uma estante I.Q.É.A de luxo.

Fica o desafio para hoje. Qual vai ser a estante I.Q.É.A. por aí?
Por aqui foi a mesa de trabalho. Fica o registo fotográfico do agora, já que não me atrevo a mostrar como estava ao início do dia e como estará, de novo, daqui a umas horas :)


Os amigos imprevistos

Há fases de vida que de tão negras que são, nem cor têm. Tão raquiticas e maquiavélicas  que nem o arco-íris quer nada com elas! Ficam assim uma michelânia de tons cinza. Cinza claro, escuro, cinza assim-assim. E mesmo que se quisesse passar corrector ou uma borracha por cima, estão de tal maneira incrustadas que parece que nada as demove. Carracitas é o que são!

Parece... Mas depois entre um telefonema e outro, alguém inesperado e altamente imprevisto e improvável, respondendo aos agradecimentos feitos por nos tentar colorir o dia diz: "É para isso que a gente cá está." Fica-se a pensar que afinal há quem caminhe ao lado ou por nós. Os amigos, aqueles mesmo a sério e que se chegam à frente de peito cheio (sem implantes esquisitos) nestas fases cinzentonas, esses já naturalmente acompanham e são, sem dúvida fundamentais. Falo dos outros, os amigos imprevistos que nos surpreendem com uma tirada desta e que por nós caminham quando já não se aguenta avançar mais.

Tenho um exercício com a minha muito querida amiga T.T. (sim, Todo o Terreno, porque está lá nos altos e nos baixos!). Num espaço de um dia estarmos atentas a tudo o que possa ser um mimo ou uma pequena lufada de ar fresco, que leve a um sorriso ou bem-estar, e enviar uma à outra via sms. As variantes de partilha ficam ao critério de cada um mas faz olhar para os acontecimentos do dia com outros olhos. É experimentar que vale a pena.

Mesmo nos dias mais cinzentos e por mais turva que esteja a visão é possível ver as muitas cores que estão por baixo da tristeza e desilusão. É mesmo. Por isso mesmo é recorrer aos amigos à séria e aos imprevistos. E o resto...há-de correr bem.



Começar de Novo

Uma vez por semana vai ser assim...falar sobre filhos. Porque os tenho, por ser a minha área de formação, porque trabalho com os filhos dos outros. Um desafio diário, dentro e fora de casa. Mas estes pequenos textos são também para quem não os tem. A vida interliga-se nos seus personagens e intenções. E digo filhos e não bebés, crianças ou jovens porque o peso é diferente quando se trata dos nossos. Por mais teorias que hajam, na hora H é tão fácil esquecer o que se leu. A vida afinal não é uma aula teórica e sim prática!

É de perder a cabeça, o braço, a perna... Há dias de tirar do sério. Tenta-se de tudo e nada resulta. A comida não entra ou então sai logo. Explica-se, pede-se até que se perde a paciência. Falo dos mais pequenos...e também de todos nós. Há dias. E todos, TODOS sem excepção, perdem as estribeiras de vez em quando. E a seguir vem a culpa com a sua voz cavernosa e os muitos Se´s... Passado o desespero é parar. E Começar de Novo.

Seja com bebés, crianças (e até nos adultos) as rotinas são importantes e resultam, mas só até ao ponto de ser também importante a felxibilidade. É tão bom ir ao mesmo restaurante de sempre porque se sabe o que nos espera, mas às vezes enjoa e é preciso arejar.

Foi isso que se passou cá por casa: necessidade de "arejamentos" para as rotinas alimentares que tantas preocupações trazem aos pais:

  • Mudar o espaço de refeição: seja com um prato novo, o lugar sentado, repensar os brinquedos utilizados para distrair, mudar a cadeira, acrescentar uma almofada, o espaço de refeição pode e deve ser dinâmico;
  • A ementa: para os mais velhos é envolver na confecção da comida (e às vezes basta tão pouco como "olha, queres por o azeite na salada?; cortar o esparguete antes da mãe pôr na panela?", procurar refeições novas, mesmo para os bebés (e que tal uma receita de arroz doce adaptada e muito nutritiva?);
  • Os horários: para uns será brincar primeiro, para outros é melhor servir alguma fruta antes acalmando a fome sem a retirar para o prato principal.
Tantas as soluções quantas os pais e filhos quiserem. Sempre que há crises de maior seja na alimentação ou noutras áreas quaisquer e depois de se experimentar o que normalmente funcionava, é repensar tudo de raiz. É que os filhos e os outros (amigos, namorados, colegas...) crescem e mudam, e tal não se nota só na roupa que deixa de servir, mas também nas muitas conquistas que se alcançam. Seja em que idade for.

Por isso, é começar de novo.
Esta é a torre que se anda a construir, para logo cair ao chão, entre olhos de espanto mas felizes de quem andava com dificuldades em mastigar sem deitar fora, para desespero da mãe. Se hoje vai funcionar? Não se sabe, mas se for preciso, e até que o hábito de mastigar seja adquirido, vão-se fazer pequenos reajustos. Isto de crescer dá muuuiiittoo trabalho, e o trabalho maior é para quem está a aprender.



O Sofá

O Sofá é das peças fundamentais numa casa. Vejamos: lá se deita, estica-se, espreguiça-se, dorme-se, aconchega-se, enfim, aninha-se como os gatos sem vontade de lá sair. Com frio então, basta uma mantinha e é um suplício para a noite, arrastar-se para a cama. Parece que tem mel, o raça da peça!

E isto tudo porquê? A zona de conforto de cada um é assim como o sofá. Quando se dá por ela (ou ele!), está a fazer-se o que se aprendeu e conquistou em fazer e se passou a fazer bem. Por lá se fica, no aconchego do trabalho, amigos, nas mesmas rotinas de ... anos. Está quentinho, não maça, não incomoda ninguém, o ritmo cardíaco mantem-se o mesmo e a vida decorre. Não que tenha mal algum. Às vezes até sabe bem. Mas acontece também que surgem desafios e propostas que obrigam a sair do sofá, daquele conforto. Da zona de conforto. Explorar outras formas de nós próprios, facetas que achamos que não temos ou são difíceis. E se os desafios surgem para acordar? Para dar um abanão...do sofá? Sentir o coração mais acelerado, as dúvidas, as incertezas atacam feitas sanguessugas e isso pode ser bom. Feito com ponderação, calcula-se o risco e avança-se aos poucos. Ninguém está a pedir à D. Anacleta para começar a andar bicicleta já hoje à tarde! Caramba, primeiro ainda tem que gostar de usar calças!

O medo de cair no ridículo, de fazer figura triste é muitas vezes o suficiente para se ficar ali, no quentinho... Na zona de conforto somos nós. Na zona dos outros tentamos ser os outros. Contudo, mesmo na zona dos outros pode-se levar um pouco de nós e fazer à nossa maneira. A D. Anacleta talvez não vista logo umas leggins para subir à bicicleta, mas pode arregaçar a SUA saia e experimentar.
Experimentar:
1. verificar por meio de experiência; ensaiar;
2.pôr à prova; testar

3.tentar

4.provar

5.sentir

(Dicionário online Porto Editora)

Os próximos tempos são de sair do sofá. Durante o dia. À noitinha...ele estará lá de novo à espera, relembrando que aquele espaço sempre irá existir mas que às vezes é preciso ir um pouco mais além. E colocar almofadas de outras cores.

Vida Virada do Avesso

Diz-se que quando se veste uma peça de roupa das avessas por distracção, se recebe uma prenda. Por distracção! Não vale agora sair à rua com um look novo, só porque sim, e esperar tropeçar num embrulho com o nosso nome.

Mas ... e quando é a própria vida virada do avesso? Assim mesmo de pernas para o ar, em que a cada passo que se dá vem algo e TUNGA, mais um triplo mortal, TARUS e mais uma rasteira! É a chamada fase de camião TIR que cansa só de levantar para ser abalroado por um veículo-comprido-pesado-que-não-respeita-as-regras-de-trânsito-e-já-me-atropelou-de-novo. Aí não há Centro de Saúde que valha, nem Hospital, nem ir só ali à bruxa para ver se tem algum milagre na manga.

A vida virada do avesso é coisa para incomodar durante uns tempos largos porque afecta várias áreas. Mói, corrói e se não se estiver bem atento deixa marcas profundas que paralisam e parecem deixar, quem passa por elas, assim a olhar...para o próximo camião TIR que vier.

Da mesma forma que a única solução para se mudar o look do avesso, para o direito (e porque não o esquerdo...isto cheira-me a discriminação...) é por tudo como estava e pacientemente, despir para voltar a vestir, também no avesso da vida é começar com uma peça de cada vez, d-e-v-a-g-a-r-i-n-h-o. Dói levar com um camião ou uma frota inteira. Daí esta ultra sofisticada técnica slow. Uma peça do nosso puzzle de cada vez. E algumas que fiquem do avesso porque é fashion! E dão algum colorido.

Por isso hoje, e só para mostrar ao maldito avesso que ainda há muita energia para dar e vender, a mesa de trabalho foi completada com uma taça de água e flores frescas, oferecidas por alguém à distância e que quis estar perto mesmo assim. Estes são os melhores seguros de Vida que se podem arranjar. Amigos.


Hoje...nem que caissem Elefantes Bebés!

Há dias em que nem que caissem elefantes bebés na rua tirariam o sorriso do rosto. Em que se sente a vida dentro e fora de nós, mesmo que o Sr. Anibal nos roube o lugar de estacionamento...de novo.

Nem o vizinho do 3º esquerdo, ao atirar a beata do cigarro para cima da roupa acabadinha de estender nos fazem desistir desta sensação boa de felicidade. E há sempre algum medo de se sentir a felicidade. Mas ela existe e deve ser celebrada. Não é todos os dias que acontecem pequenos milagres como ver uma criança andar pela primeira vez! A primeira de muitos passos. Que recebemos notícias boas de amigos próximos. Em que por breves instantes percebemos o sentido do caos. Que a amizade sincera nos chega de quem nos quer tão bem através de mails, sms ou telefonemas.

Nesses dias em que é tudo muito cor-de-rosa ou outra cor qualquer, algo avança cá dentro. Acreditar em tempos cinzentos é, não só necessário, como fundamental. Mesmo que tenha um pouco de fantasia ou estupidez natural. Por isso hoje foi dia de se ouvir as músicas lá no carro em alto som (um CD já gasto mas "Mãe...só mais uma vez!"), de se buzinar várias vezes sem motivo aparente para arrancar um sorriso aos mais pequenos, só porque hoje é dia de... nem que caissem elefantes bebés! E digo elefantes bebés porque um elefante a sério é coisa para magoar assim um pouco quem apanhe com ele em cima. Mas só um pouco e quem sabe se a propósito dele não se conhece um enfermeiro giro? Quem sabe, hoje está tudo em aberto. Chovam elefantes, ou não.

P.S.: Só assim para celebrar o dia de cada um, os mimos, a pequena M., façam o favor de apagar as velas :)

Faço o que Posso e faço Tanto!

Há uns meses largos, estava numa loja de telemóveis à espera da minha vez para ser atendida. À minha frente um homem observava com surpresa o despacho da funcionária em realizar três tarefas ao mesmo tempo. A relação  informal entre eles permitiu que ele manifestasse o seu espanto em como é que ela era capaz de fazer mais do que uma tarefa ao mesmo tempo. Fê-lo sem gozo, com genuína incredulidade. E ela respondeu com a mesma genuidade de que era o normal.

Cada dia tem uma montanha de afazares e problemas imediatos para resolver. Todos eles urgentes e prioritários. Na maior parte das vezes, acontece precisamente isso, fazer várias coisas ao mesmo tempo. Tornou-se o normal, a única forma possível de funcionar e do universo ter uma ordem... Será? A resposta é de certeza individual e varia ao longo do tempo e das fases de vida.

Por estes dias, alguem muito querido e com um enorme sentido de oportunidade disse apenas, em jeito quase de oração e pedindo para ser repetido no fim de um dia cheio, muito cheio esta frase: “Faço o que posso e faço tanto.” Na verdade cada um, quando leva isto do seu dia-a-dia mais ou menos a sério, faz o melhor que consegue para aquele momento. E isso deveria bastar para nos sentirmos gratos no fim de cada dia. Sem pesos desnecessários de se achar que se deveria ter feito SÓ mais aquilo. É que há dias que parecem meses de tanto terem lá dentro acontecimentos, emoções, precalços e problemas. Faço o que posso e faço tanto...sensação de satisfação do presente e agora. Aceitação dos limites e energias. E agora vou ali sentar-me só por 2 minutos, não fazer nada a não ser contemplar aquela janela que está farta de me chamar!