Dar tempo ao luto

Tenho uma querida amiga a passar um processo de luto. E ela é uma valente, de uma luz e força que não se vê muito. A perda de um filho vira as fases do luto ao contrário. Perdem-se as regras e as psicologias. 

Escrevo isto tudo com o consentimento dela. Por conversas que tivemos e outras subentendidas. Escrevo também por motivos de uma outra perda que aconteceu, numa comunidade pequena e grande de emoção e afetos. 

As perdas são sempre perdas. E quando há emoções e afetos de verdade, doem sempre para lá do que se consegue explicar. As perdas ao contrário, de pais que perdem filhos, em situações inesperadas, deixam vazios que não se explicam. Perguntam-se muitas vezes os Porquês e os Comos até à exaustão. Procuram-se os últimos passos e escolhas e se terão sido feitas as melhores decisões. Mesmo não havendo culpas algumas, elas revisitam-se e soltam-se fúrias. É preciso deitar para fora uma dor que não tem tamanho. Não tem tamanho a saudade, a falta dos abraços, dos sorrisos, até dos choros. De tudo. Falta uma parte dos pais, muito mais importante que um braço ou uma perna e que estes pais trocariam no momento, por esse seu bem mais precioso: um filho. 

Um filho é por isso uma extensão de nós: de sonhos, de expetativas, de um caminho de passado percorrido mas de um tanto futuro que ainda estaria para vir. 

Nestas alturas não existem as palavras certas porque nada apaga essa dor e essa saudade. É preciso um tempo e um espaço para a dor e para um luto. E que varia de cada mãe, de cada pai. É preciso deitar fora a irracionalidade que assola. É preciso tudo isso. Por isso quando me perguntam O que se diz nestas alturas?, há na verdade muito pouco a dizer. Apenas um sincero estou aqui, que pode ou não ser verbalizado. Às vezes basta a presença, um abraço sincero e sentido, um olhar. Oferecer ajuda nas coisas práticas. Deixar a porta aberta, a da casa e do coração, para que quando for preciso, estar disponível. Até lá... É estar apenas. Mesmo que em silêncio. E ouvir. Ouvir mais do que falar. Não se julgue, não se diga Se fosse eu... Cada história encerra em si um caminho próprio. 

A vivência da perda de um filho é para lá do que é possível explicar. Por isso, não se apresse o que é impossível de ser apressado. 

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