Ficou para ali a olhar o copo. Era um copo bonito até. Um turquesa transparente que ao sol, parecia quase cor de céu, em dias de praia bons. Ficou para ali a vê-lo encher. Não se conseguia mexer. Como se o corpo não lhe obedecesse. Era só esticar a mão e fechar a torneira mas entre a distância da extremidade da mão e a torneira, estava a distância do peso dos dias. E pensou que mal teria se se deixasse ficar assim. Só a olhar a ver o copo encher. Não sabe bem se passaram alguns minutos, ou horas ou até dias naquilo. Só sabia que não se conseguia mexer. Ficou ali a olhar o copo a transbordar. E depois foi a bacia onde estava o copo e foi passando para o chão, até que lhe chegou aos pés. E olhou para baixo e para todas aquelas coisas que lhe gritavam urgência. Para parar, para decidir, para dar passos, muitos passos que se transformassem em caminhos que havia para percorrer.
Um copo a encher-se de tudo e todos. Um copo a transbordar. Cheio de coisas, de pessoas, de ideias, da falta delas, de tarefas (muitas!), de decisões. Mesmo, muitas, muitas coisas. E ficou ali a vê-lo encher, encher até que começou a transbordar e já não sabia se era do copo ou se era dela. Só sabia que entre o transbordar do copo (ou seria dela?) a torneira de coisas precisava de ficar fechada por uns tempos. Deixar secar aquilo tudo. Limpar, o copo e a alma.
Às vezes é preciso parar e sobretudo esvaziar os copos para que possa entrar realmente o que interessa, realmente o que lhe interessa. Deixar sair, para deixar entrar.
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