O palavrão


No caminho para o trabalho, fazia o balanço dos últimos dias, do ano inteiro. Dos muitos desafios, obstáculos, das chatices, das pessoas-chatices, melgonas, aborrecidas e que aborrecem. Uma irritação crescente que contaminava já há vários dias, o olhar pela vida, pelos dias.
E enquanto a chuva caía, entre nuvens e um céu azul que até queria espreitar, apercebeu-se da importância dada a essas gentes, a esses acontecimentos. Como quem não quer a coisa, como quem não quer nada, nem se chateia, veio o palavrão em alto e bom som. E por não ser  habitual, ecoou muito mais do que seria desejado.

Foi ali, entre uma rua e outra, entre o trânsito, algumas árvores, a azáfama daquele dia, que  foi para dentro do saco:
  • Os atrasos, de tempos de relógios;
  • As  pessoas que sugam;
  • As contas que não interessam;
  • As chatices da casa, do carro;
  • As pessoas que moem, e ruminam aos nossos ouvidos histórias que não interessam nem ao menino Jesus ou ao coelhinho da Páscoa!
  • O trabalho burocráticos pegajoso e mal-cheiroso;
  • E de novo…as pessoas que mesmo em pequenos momentos atormentam as nossas vidas.
  • ...

Fechou bem o saco e mandou-os a todos para a M… e foi tremendamente libertador. Perceber que é possível enviar todo esse saco de gente e coisas, para a Cochichina, para trás do sol posto, para o raios que o parta (que ainda não se fazem sacos pára-raios!).
Ficou uma liberdade de sentimentos e de ação, difícil de explicar. Mandar tudo o que não interessa e faz mal às nossas vidas, para a M… em alto e bom som!

 Absolutamente tudo.

E são estes os votos. Tudo o que não interessa, o que polui o ar que respiramos, que faz chorar sem motivo aparente, que faça sofrer escusadamente, que não nos liberte para sermos melhores e melhores ainda, tudo isso, sem exceção, vai para o saco.
E a seguir para a m…  
O que fica será certamente melhor.




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