Já perdi a conta, das vezes em que o sr. João me salvou:
“Ó senhor João…
consegue salvar estas mochilas? Precisávamos para 2ª…” Foi assim, que numa
sexta-feira à tarde, depois das mochilas dos dois terem avariado e eles me terem dito –Mãe,
precisamos de mochilas novas! – que lhes respondi que não e fui ter com o
sr. João, salvador em tempo record.
“Sábado de manhã
passe cá, que estão prontas.” E assim foi.
Ou aquela minha
mala preferida de tantos anos, ou sapatos de uma vida. O sr. João encontra uma
forma, a partir do momento em que faz o diagnóstico rápido dos seus
“pacientes”. É o único sapateiro em funções na vila da Sertã e proprietário da
sapataria mais antiga de cá. Tem uma enorme paciência para quem por lá passa.
Tem na história da família, isto de ser sapateiro, mesmo que os tempos tenham
mudado e as exigências dos clientes também. De um lado da rua do Castelo a loja, do outro, a oficina de sapatos, numa das zonas mais históricas da Sertã. Pai de três
filhas talentosas é agora avó de um rapaz.
Vamos cuscar o
sr. João?
Idade: 61
Naturalidade: Sertã
Comidas preferidas: Gosto de comer de
tudo
Um livro a não perder: A morte de
Catarina Eufémia
Um
sítio de sonho visitado e outro de sonho a visitar: Açores e Brasil
1.
O que queria ser quando era pequeno?
Sempre quis ser comerciante, fazer atendimento ao público, estar atrás de
um balcão. A arte de sapateiro surgiu por acaso. Não queria seguir a profissão
do meu pai, ser sapateiro, mas o destino colocou-a no meu caminho.
2.
Uma parte da sua juventude passou por Lisboa mas
acabou por regressar. O que tem esta região do interior, que o encanta?
O voltar à terra Natal. Comecei em Lisboa, mas fixei-me na Sertã.
3.
Como é que a música continua a ser importante no
seu dia-a-dia?
A música descontrai. O facto de ter sido durante muitos anos
vice-presidente da FUS, serviu para servir a coletividade e a nossa terra.
4.
Quem o conhece, vê-o sempre com muita energia e
um bom dia no rosto. Onde vai buscar essa boa energia?
A força de vontade é muito importante. E o pensar positivo, também.
5.
É pai de três raparigas! E agora avô de um
menino. Para si, como é que ser avô está a ser diferente, de quando foi pai?
Ser avô é ser pai duas vezes. É diferente! É muito diferente! É uma
alegria inexplicável! Faltam-me as palavras… (emocionou-se)
6.
De onde vem esta paixão pelos sapatos?
Comecei em Lisboa, já lá vão 42 anos. Comecei com um tio meu que tinha
três sapatarias em Lisboa, todas com oficinas de consertos. Foi lá que eu
aprendi, apesar de o meu pai e o meu avô, pai do meu pai, já eram sapateiros.
Só que era tudo manual com o meu pai e eu não quis aprender. Então, em Lisboa
com o meu tio aprendi porque já tinha máquinas. Nunca fiz um par de sapatos à
mão, à exceção de um chinelo artesanal que faço que vendo durante o Verão.
Sempre trabalhei com máquinas. É mais fácil, facilita o trabalho e é mais
rentável. Por ser mais rápido, ganhei a alcunha de ser o “sapateiro rápido”. Em
Lisboa, estava encarregue de uma sapataria que o meu tio me entregou na Quinta
das Mouras, no Lumiar. Fazia o atendimento ao público e nas horas vagas
consertava sapatos. Na Sertã fui pioneiro no arranjo de sapatos à máquina,
haviam sapateiros mas eram todos manuais. Tenho a máquina de coser, coser meias
solas ou ténis, etc; a máquina giratória, máquina de pequenas costuras com
várias cores conforme os sapatos; a máquina de acabamentos com a frese, a de
engraxar, a de brunir; a máquina da prensa, para apertar as solas para colar; a
forma de sapateiro; a máquina de cortar sola ou borracha; broca para furar os
saltos das senhoras; etc.
7.
Qual foi o par de sapatos mais especial que já
vendeu?
Todos eles são especiais! Todos eles são importante!
8.
Para si, o que é importante, quando compra um
par de sapatos?
Importa acima de tudo a qualidade, o design e o preço.
9.
O que mudou, na arte de vender sapatos?
A diversidade de sapatos. Cada vez há mais modelos, mais diversidade,
mais oferta.
10.
Que histórias contam os sapatos que tem para
arranjar?
Os sapatos têm histórias para os donos dos sapatos, para mim não. Certamente que cada um terá a sua história. Posso imaginar por onde já passaram, como foram tratados, mas os donos são outros. As pessoas já não arranjam o calçado como antigamente. Um sapato ou uma bota era todo reconstruído, agora não passa por pôr umas capas ou umas solas e solas já nem toda a gente põe porque o calçado atual é todo à base de borracha. As pessoas preferem comprar novo a arranjar. Não arranjo só sapatos, arranjo malas, fechos, etc.
11.
Porque é tão importante, que as pessoas
continuem a comprar no comércio tradicional?
Pelo apoio que dão às pessoas locais. Creio que o atendimento seja muito
mais individualizado e qualquer problema que tenham, sabem sempre que podem
contar connosco. Localmente, ajudamo-nos mutuamente a todos. E isso é muito
importante!
12. Este blog chama-se Penso Rápido – pequenos
remédios para as comichões do dia-a-dia. Que Penso Rápido usa no seu dia-a-dia?
Viver o momento. O importante é começar para poder terminar.
Conheço bem o sr. João, a esposa, e algumas das filhas. As minhas melhores botas para uso no inverno foram lá compradas. Gostei tanto que comprei outro para no inverno seguinte. É muito simpático, o seu trabalho muito útil, e merece bem ser apoiado.
ResponderEliminar❤️ Obrigada João Pedro! Obrigada Bélinha pela linda entrevista! ❤️
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