Precisamos de nos abraçar mais

Ontem ao fim do dia, entre passar roupa a ferro e começar a tratar do jantar, a Maria perguntou se podia ir jogar um jogo de tabuleiro porque ainda não tínhamos feito nada juntas. Num cenário lindo de novela, largaria tudo e ia jogar. Há dias em que é possível, ontem não dava porque sabia que daí a 40 minutos iam-me perguntar o que havia para o jantar e não lhes podia responder: jogo de tabuleiro! Então perguntei-lhe se queria fazer comigo, um bolo para comermos como sobremesa e assim estaríamos juntas a fazer algo. Concordou logo e foi tão bom aquele tempo de nós as duas. 

Semana passada, enquanto novamente passava a ferro, perguntei se queriam jogar um jogo de tabuleiro. Que eu tomaria as decisões e daria as respostas mas que pedia a ajuda deles para jogarem por mim. Estávamos os três juntos e divertimo-nos muito mesmo comigo com um ferro na mão. 

No outro dia, a Sónia Morais, do Cocó na Fralda, descrevia aqui um desabafo sobre as suas correrias de mãe com quatro filhos. Conciliar horários, esperas, levar uns a um lado enquanto, ao mesmo tempo, desenvolve o seu trabalho. Muitos dos comentários que recebeu foram de crítica de que, não fazia sentido queixar-se, que é uma privilegiada, que a escolha de 4 filhos ou de ser trabalhadora liberal era dela e que por isso não fazia sentido estar ali naquela lamuria. 

Na altura, comentei o seguinte:

"Um dia vamos ser uma comunidade de mães e pais que se apoiam. Que percebem que as realidades são todas diferentes umas das outras. Todas. Que todos fazemos escolhas diferentes. E que, temos tanto direito para nos queixar, apenas para a seguir continuar a fazer caminho. Deitar para fora faz bem. Faz bem à Sónia, faz bem a mim, faz bem a toda a gente. Torna-nos humanos mostrar a vulnerabilidade de cada um. Aceitá-la. Desejosa desses textos em vãos de escadas, a fazer o pino, a andar de bicicleta! A realidade da Sónia é diferente da minha e estou grata por essa partilha porque é possível retirar das suas aprendizagens aquilo que faz sentido no meu caminho. O resto pertence à Sónia.
Porque um dia, vamos ser uma comunidade de mães e pais que se apoiam.Independentemente, se têm empregada ou não, com bicicleta, carro ou triciclo, com avós/maridos/vizinhos a apoiar ou sozinhas. Abraço Sónia :)"

Esta semana vi este este vídeo da Megan Markl sobre a sua experiência na maternidade e como a simples pergunta de Como é que te estás a sentir? pode ter um impato importante na forma como nos vemos como mães e nos apoiamos. 

O vídeo foi postado na página poderosa da Rafaela Carvalho e para além dela, sigo mais um ou dois testemunhos de Mães, por coincidência (ou não) brasileiras e que abraçam a sua maternidade, abraçando a dos outros. São mães normais que partilham as suas fragilidades e conquistas, sem se sobrepor, nem vitimizar. A grande diferença de discurso e testemunhos que encontro aqui é menos julgamento e maior aceitação. 

Aceitação que há dias em que o leite vai entornar e o filho, vai com uma nódoa para a escola mas a sorrir. 

Aceitação que há dias em que em vez de uma sopa, conseguiu-se que comessem um pouco de verduras mas escolheu-se que o momento alto do dia era estarmos juntos ao jantar mais do que se recriminar porque não seguiu toda a tabela nutricional devida.

Aceitação que há dias em que não se conseguiu escovar o cabelo da filha e foi de toutiço mesmo, levou dois beijos bem dados nas bochechas antes de por a mochila nas costas. A recordação principal daquela manhã, foi o beijo da mãe. 

Aceitação que há dias em que se vai para a casa de banho, para o segundo banho do dia para chorar em paz, sem ser interrompida e mesmo assim, uma mão pequena vai bater na porta e diz: "Mãe, estás aí?"

Aceitação. Aceitar que em cada momento apenas fazemos o nosso melhor. Que o melhor de cada um tem a ver com a sua realidade, a sua história, o seu contexto. Menos julgamento, mais aceitação, mais abraços. Aceitar a sua realidade e a dos outros. Seja na maternidade ou em outra coisa qualquer. 

Porque um dia vamos ser uma comunidade de Mães e Pais que se apoiam.



Pais que Respiram
Porque (Em)Birras comigo? 
26 outubro - Sertã
29 novembro - Lisboa

Inscrições: abelpb@hotmail.com


A história

Das minhas maiores descobertas do ano passado foi ler e aplicar o chamado minimalismo. Não no sentido radical, nem de um dia para o outro (nem dava...com duas crianças em casa!) mas sei que é um processo, um caminho que pretendo continuar porque lhe encontro muitas vantagens. Esta nova área de interesse levou-me a conhecer, explorar novas pessoas e leituras de que irei falar mais para adiante. 

Hoje de manhã, caiu-me no colo mais um desses textos que não sendo novidade, encaixou muito bem. Há dias em que de tanto pedirmos, nos aparece à frente, o que precisamos de ouvir. Joshua Baker é um entendido nas matérias sobre viver de forma mais simples e genuína e escreveu um artigo sobre a história que contamos a nós mesmos. 


Não consigo emagrecer ou engordar, porque nunca soube fazer boas escolhas de comida. 
Não consigo deixar de fumar, eu já tentei e não deu.


E a lista não tem fim. O que me fez pensar em qual a minha história como mãe.

Que história estou a contar a mim mesma sobre ser mãe? 
Que mãe sou para o João e que mãe sou para a Maria?
Que mãe sou às 8h da manhã ou às 9h da noite?
Que mãe sou quando me fazem 20 perguntas ao mesmo tempo?
Que mãe sou quando não estou bem?
Que mãe sou quando estamos todos com pressa, quando me dizem que não querem comer ou quando me pedem cinquenta vezes a mesma coisa?

E que história é essa que me conto, depois de responder a estas perguntas, depois de os deixar na escola, de lhes ralhar, de ficar frustrada ou muito feliz? Que história é essa que me conto quando as coisas correm bem ou correm mal? 

A história vai mudando com o tempo e com a nossa fase de vida. Às vezes basta lermos mais alguma coisa, ou termos uma conversa com alguém que nos inspire para percebermos que afinal, a nossa história tem mudança possível. Outras vezes basta apenas parar. Só isso. Parar e respirar fuuuuundo. 

Vamos sempre a tempo de mudar a nossa história? Sim. Acredito profundamente nisso. Reajustando as expetativas, sendo mais generosos conosco e com quem nos rodeia. Introduzindo o que faz sentido nas nossas vidas de mães e pais. Em pequenos passos. Pensando e agindo. Pensando e agindo. Pensando e agindo. 

Por isso fica a pergunta.




Próximas ações:
Porque (Em)Birras comigo? - 26 outubro - Sertã
Pais que Respiram ... na Escola - 29 novembro - Lisboa.
Informações: abelpb@hotmail.com


Há um ano

Na véspera do meu aniversário, estava aterrada no sofá ao fim do dia. Miúdos deitados e por isso a aproveitar aqueles vinte minutos, em que ainda me mantenho acordada e com alguma lucidez. A Mia saltou para ao pé de mim e ficou a fitar. E eu fitei-a também. E nesse instante faço uma viagem de 365 dias. 

Há um ano não tinha uma gata em casa. Aliás, sempre disse que não iríamos ter animais porque ia dar mais trabalho, porque não cresci com animais e não sabia o que lhes fazer. Um ano depois, estava a alimentar uma gata de dias, com seringa de leite, na esperança de a manter viva. Aninhei-a ao colo para que ela pudesse sentir o calor, substituindo um início de vida sem mãe. 

Há um ano estava longe de imaginar que ia correr uma maratona. Mais, que ia arranjar forma de me preparar minimamente para uma, que ia sair do país para o fazer, que ia começar e atravessar a meta. Pelos meus dois pés. 42,195km. 

Há um ano tinha o sonho e a vontade de continuar a ir de mochila às costas com eles e irmos descobrir novos horizontes. Então um dia, lá fomos de novo. E o sorriso deles, compensa tudo o que é preciso poupar e fazer, para lá chegar. 

Há um ano tinha a vontade mas a pouca certeza de voltar ao yoga e muito menos à meditação. Ainda longe de fazer grandes acrobacias com o corpo ou com a mente, mas mais perto de respirar cada vez melhor. No yoga, nos dias e na meditação. É um caminho que tem tonalidades tão ricas, quantas as entregas que se queiram fazer. Com pessoas de luz que partilham deste caminho, guiadas pela mestre Sara e o sábio luminoso Tomás. Que caminho poderoso este e que descoberta que tem sido.

Há um ano queria voltar ao Pais que Respiram, aos encontros com quem quer insistir em ver uma outra forma de olhar o seu amor e entrega como mãe, como pai, como educador. Agora o verbo querer, conjuga-se no presente e o queria, transformou-se em vai acontecer. 

Há um ano estava longe de imaginar que amizades em suspenso voltaram a encontrar-se, por motivos tristes mas verdadeiros e cheios de amor. Descobri que a amizade e o amor, não se guiam por calendários ou relógios. Acontecem e vivem-se quando têm que ser, quando são precisos ou porque a força que os une, assim o faz acontecer. 

Há um ano atrás não imaginava que algumas pessoas iriam partir e isso dói. E na mesma proporção recebi notícias de que pequenos seres que estão para chegar e fizeram-me encher os olhos de alegria. São os balanços e ciclos.

Num ano cabem tantas vontades, tantos imprevistos. Haja um abraço para os receber e um coração grande para os guiar, naquela sabedoria que os anos vão trazendo. Estou grata aos 42, com todos os momentos doces e os outros. Os outros que fizeram crescer, puxar, quase desistir mas afinal vieram para ensinar. 
Venham os 43. 


Imagem da Skyla Design