Vamos Cuscar 23#



Não sei se me encantei mais com as imagens reais da forma de ser mãe, onde os filhos não estão a posar para uma máquina fotográfica, com laçarotes na cabeça, acabados de ser engomados, mas antes lambuzados de fruta, descalços a correr ou a andar de skate ainda de pijama. Imagens reais. Ou se foi com os textos, umas vezes em jeito de desabafo, de baixar ligeiramente os braços (quem nunca…), outras em forma de abraço, muitas vezes com um humor de ternura, onde nos sentimos acolhidas como mães e sobretudo, como mulheres. Entre o riso ou a comoção, não se fica indiferente ao que a Rafa escreve, porque escreve com o coração.

Separa-nos um vasto oceano. Rafaela Carvalho é brasileira de nacionalidade mas a viver há uns anos, na Califórnia, nos Estados Unidos, com o seu marido, os quatro filhos - Cae com 15 anos, Dom com 5, Zara com 4 e Ravi com 19 meses - e um cão. .

Pelo meio houve viagens por 35 estados da América do Norte, durante mais de meio ano, na altura “apenas” com três crianças. Quer dizer, o quarto filho, o Ravi, acabou por fazer uma parte do percurso mas na melhor autocaravana do mundo: dentro da barriga da mãe.
Entretanto surgiram os êxitos da escrita, apesar da sua formação como nutricionista. É essa sua forma de ser com os pés bem assentes no chão e aquele brilho de  mulher-guerreira-com-amor-humor, que lhe deram a força e a determinação de ter atualmente uma editora onde, para além dos seus livros, apoia, outras mulheres com paixão pela escrita e uma nova forma de se cuidarem como Mulheres e como Mães: sem tanta culpa, com muito respeito e amor. Em acolhimento e partilha.
Vamos cuscar a Rafaela Carvalho?

Idade: 35 anos
Naturalidade: Brasileira
Comidas preferidas: Nhoque
Um livro a não perder: “Me before you, “In the woods”, The girl with the dragon tattoo”, “If I stay”, “Everything I never told you”, “Eat, pray and love”, “Proof of heaven”. Desculpe… difícil escolher só um.


1.       Desde o primeiro maternar até esta 2ª leva de ser mãe, há um intervalo de 11 anos e a Rafaela não é mais a mesma. O que fez a diferença nessa forma de ser mãe? Qual o ponto de viragem?
Fui mãe muito jovem, tive o meu primeiro filho com 18 anos e fui ter o meu segundo, 11 anos depois. Para além das diferenças normais, de uma mãe de segunda viagem para uma mãe de primeira viagem, onde a gente tem uma confiança muito maior, onde nós não somos tão imediatistas, tão … inflexíveis com as nossas decisões, também teve a questão do amadurecimento normal da idade, né? Não dá para comparar essa diferença de 11 anos de Vida, de experiência. Eu já era outra pessoa, não só como mãe, mas era outra Rafaela.




2.       Sendo nutricionista de formação, como tempera os seus momentos de maior loucura (e desespero!) com os 4 filhos?
Depende muito do dia! Adoraria responder que sou sempre calma e que pratico sempre a disciplina positiva, e que medito em todos os momentos de loucura mas isso não é a verdade. Então há dias em que eu consigo respirar fundo e agir da forma que eu gostaria. Mas há dias em que esse respirar fundo não vem, e que a gente perde a cabeça mesmo e fala o que não deve, e  se arrepende e eu acho que o equilíbrio é isso. A gente tem dias ruins mas volta para aquela linha, dos dias bons e com o tempo a aprender a ter menos dias ruins, do que dias bons. Mas aprender a viver com filhos, com 4 filhos, tem essas variáveis, não tem como fugir!



3.       Porque se tornou uma paixão para a Rafaela, viajar com crianças numa Autocaravana ou Motorhome, seja por meses ou fins-de-semana?
Sempre amei viajar, sempre amei aventuras. Tenho um lado cigana muito forte, dentro de mim. Não me apego a endereço fixo, amo mudanças, então isso já é algo meu. Então eu parto muito do princípio que a minha realidade hoje é com uma família, com 4 crianças, na verdade 3 crianças e 1 adolescente. Essa é a minha realidade e eu não tenho como fugir dela. Aliás, as minhas opções ficam: ou vivo esse momento de uma forma "segura e tradicional", ou me aventuro dentro das circunstâncias que estão no meu momento que é ter 4 filhos, sendo que três são pequenos. Sabe aquele velho ditado: Não tem tu, vai tu mesmo? É mais ou menos isso.



4.       O que está a aprender, com cada um dos seus filhos? O que sente que cada um deles lhe veio ensinar?
Cada pessoa que se cruza no nosso caminho, vem para nos ensinar alguma lição. Com filhos então isso é muito mais intenso e muito mais notável. Todos os meus filhos me ensinam diferentes lições mas uma lição em comum é estar presente, ter paciência… essa para mim é a mais difícil, e abrir mão do controle. Acreditar no ritmo da Vida. Eu acho que todos os meus filhos me ensinam essa questão da confiança e viver um dia de cada vez.


5.       Entre a realidade de ser-se mãe no Brasil, nos EUA ou em qualquer parte do Planeta, o que encontra de semelhante? O que nos une como mães?
Acho que o que mais nos une como mães são as nossas fraquezas, que são fruto desse amor maluco, desenfreado, enorme, gigantesco que é esse amor de Mãe. Esse amor forte traz muitas fraquezas e inseguranças, então desde o cansaço, o medo, as dúvidas, o deitar a cabeça no travesseiro e pensar: O que é que eu podia ter feito melhor, no que é que eu me excedi, o que é que faltou… Então todos esses pontos difíceis, que são consequência do amor de mãe, eu acho que isso é o que mais nos une.



6.       Há pouco tempo editou um livro sobre as Novas Tecnologias. Porque foi importante para você publicar esse trabalho?
A relação do meu filho mais velho, com os aparelhos eletrónicos, foi algo que marcou muito a nossa jornada. Como comentei anteriormente, fui mãe muito nova, e na época, não tinha nem conhecimento, nem maturidade para mediar e para guiar essa relação entre o meu filho, que na época era uma criança pequenina, e os aparelhos eletrónicos. Então nós fizemos um longo caminho, nesses últimos anos, com a questão da falta de equilíbrio e o uso das tecnologias. Por isso, para mim foi muito mais do que um livro, foi conhecimento que gostaria ter tido na época e que não tive. E que teria-me poupado, nos poupado, muito sofrimento, muitas lágrimas, muita dor de cabeça. É o livro que gostaria de ter lido, muitos anos atrás.

7.       A escrita tem sido um contributo seu para unir mães, à volta da fogueira e criar uma comunidade de partilha, uma rede de apoio. O grande êxito de 60 dias de neblina assim o têm mostrado, em breve também adaptado para o teatro, no seu país natal. Quando o publicou, como foi receber os primeiros feedbacks das muitas mães que a acompanham?
Não posso nem dizer que é um sonho, esse sucesso, do 60 dias de neblina, porque eu jamais sonhei em escrever um livro, que tivesse um alcance tão grande. Para mim quando recebo esses feedbacks, essas reviews de outras mães, é um quentinho no coração que não sei nem explicar. Na verdade, quando comecei a compartilhar a minha escrita, eu fazia por terapia, porque é algo que eu amo, por demais fazer. Diria até que, fora a minha família, aquilo que mais AMO na vida é escrever. E a gente cresce ouvindo dizer que trabalhar é chato, trabalhar é cansativo e por uma certa forma, eu entendo de onde vem esses vários comentários negativos sobre o trabalho mas para mim é difícil de acreditar que eu trabalho, com aquilo que eu AMO e eu esqueço que é um trabalho. É o maior presente da minha vida profissional, é receber esses feedbacks de outras mães, de outras mulheres, que passam pelos mesmos sentimentos que eu passei e que elas se identificam. Então são abraços retrocados, virtualmente e através do livro.




8.       O que ainda hoje a surpreende ou comove nessa acolhimento de quem a lê?
O que me surpreende, e ainda me vai surpreender sempre é o poder das palavras. É como as palavras têm um alcance muito grande. Como nós temos que  ter cuidado com as palavras. A força das palavras é uma coisa magnífica e eu de verdade acho que a gente troca abraços, energia, sensações, amor de tantas coisas através da escrita. Não me canso de me surpreender como isso é poderoso.Como há uma frase que eu escrevo aqui, pode mudar o dia, pode afectar o maternar de uma família que mora a milhas e milhas de distância da minha. Então o poder das palavras é muito sagrado.



9.       Para as mães de 1ª viagem, mais do que grandes respostas ou opiniões, que pergunta é importante fazer?
Eu acho que o mais importante é olhar no olho dessa mãe e perguntar: Está tudo bem? Mas olhar… sabe quando você pergunta com a real intenção de saber a resposta? E não aquele Oi, tudo bem? É você parar, olhar no olho e perguntar: Está tudo bem? Porque quantas vezes eu quis ouvir essa pergunta de forma sincera e ela nem sempre chegou. E eu acho que muitas mulheres entendem o que eu estou falando.

10.   Este blog chama-se Penso Rápido – pequenos remédios para as comichões do dia-a-dia. Que Penso Rápido usas no teu dia-a-dia?
Tenho alguns mantras que eu uso no meu dia-a-dia. Mas se tem um que me marcou muito, que eu escutei, já tem um bom tempo é que: Amanhã será mais fácil. Tudo o que está doendo hoje, tudo o que está difícil hoje, tudo o que está pesado demais para carregar, amanhã ficará melhor. Amanhã será mais fácil.




Podem acompanhar a Rafaela Carvalho aquiaqui.
O trabalho dela está disponível aqui.




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