Uma panela de ferro

Era uma cozinha com cheiro defumado, um pouco negra até do fumo da fogueira no chão. Umas panelas de ferro por cima. Um caldo de sopa, com couves. Um chocolate quente, feito por alturas da Páscoa, tão forte por ser com leite de vaca fresco, muito, muito açúcar e várias tabletes derretidas em lume brando, tanto quanto a lenha que a minha querida avó Maria quisesse colocar. Tão forte que acabava sempre comigo, em amena descarga intestinal mas, que interessava isso, pelo sabor forte e emocional daquilo tudo. Demorava tempo cada uma destas iguarias. Ainda lhes sinto o sabor e o cheiro.

Muitos anos depois, recebo uma mensagem via WhatsApp. Estou a fazer o jantar, em modo de ritmo de semana: panela de pressão ao lume com sopa, filetes e arroz a fazer no forno, para rentabilizar recursos e tempo. Vejo de esguelha a mensagem e paro tudo. Sorriu. Uma panela de ferro ao lume. Um caldo com cor vibrante. Um prato de sopa a que quase sinto o cheiro. A minha querida e doce avó Maria, já não está cá para assistir a estas modernices de se verem sopas e lareiras, à distância de um clique. Num segundo, teletransporto-me para a pequena casa desta minha avó: cheiros, sorrisos, os beijos dela. 

Num segundo depois estou a ler esta mensagem, enviada por esta tão sábia amiga. Decide sempre escolher uma ou duas palavras no início de cada ano e que definirão o norte das suas ações, durante os 365 dias que o compõem. Esta minha amiga, pensa de forma bonita, pondo a razão ao serviço do coração e por esse mesmo motivo, completou a palavra serenidade, com esta panela de ferro. Fazer o lume. Esperar pelas brasas. A água e o seu tempo de fervilhar. Colocar os ingredientes. Mexer tudo. Saborear uma sopa, feita de tempo, reflexões, gratidão e vagares. 

Cada um adequar os ritmos, ao que lhe faça sentido. A mim iria dar-me um ataque de nervos, se tivesse que fazer assim, as sopas, cá em casa. Mas admiro-a tanto nesta capacidade individual de se saber respeitar. 

No fundo, passa por cada um saber respeitar, o que a cada um, faz bem. 

Escolham-se as palavras que nos façam felizes. Mude-se o contexto que nos rodeia. As mudanças por dentro, acontecem com pequenas mudanças por fora. Ponham-se em prática as ações que lhes vão dar vida. Saboreiem-se estes e outros caldos. 






1 comentário:

  1. Parabéns Bela Ana,
    é isso mesmo!! faz-me tanto sentido:
    Cada um saber respeitar o que lhe faz bem:)
    Que é possível, em gestos pequenos, mudar contextos menos bons!!
    A avó Maria também o sabia:)
    Do alto da sua sabedoria, fazia,
    Fazia afetos e sonhos, que se prolongam em quem lhes pega!!!
    Continua a prolongar, os seguintes vão pegar;)
    Jokitas

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